Artur Gomes -Como se processa o seu estado de poesia?
Antonio Carlos Secchin – Como escreveu Manuel Bandeira, escrevo poesia quando ela quer. Persigo-a sempre, só a encontro (se é que a encontro) às vezes.
Artur Gomes – Seu poema preferido? Próprio. Ou de outro poeta de sua admiração.
Antonio Carlos Secchin – O meu-um que eu diga: Me parece tão realizado que nem parece que fui eu que escrevi!
O de outro: quando, saindo do sonho de manhã, eu constate que o poema já existia, e era mesmo de outro autor.
Artur Gomes – Qual o seu poeta de cabeceira?
Antonio Carlos Secchin – Prefiro a cabeceira vazia, para que, antes de adormecer, a memória possa visitar vários poetas, trazendo-me um pouco de cada um.
Artur Gomes – Em seu instante de criação existe alguma pedra de toque, algo que o impulsione para escrever?
Antonio Carlos Secchin – O desejo incontido do poema em ser escrito, ainda que eu não queira atendê-lo.
Artur Gomes -Livro que considera definitivo em sua obra?
Antonio Carlos Secchin – Tudo o que publico considero provisoriamente definitivo, correspondendo ao melhor de mim naquele momento. Numa segunda edição, tenho oportunidade de constatar quão provisório era meu “definitivo”, e tento torná-lo menos imperfeito.
Artur Gomes – Além da poesia em verso já exercitou ou exercita outra forma de linguagem com poesia?
Antonio Carlos Secchin – Para mim, dispor das palavras e conseguir dar-lhes certo ritmo já está de ótimo tamanho.
Artur Gomes – Qual poema escreveu quando teve uma pedra no meio do caminho?
Antonio Carlos Secchin – Iria escrever um que começasse por “No meio do caminho tinha uma pedra”, mas descobri que no meio do caminho já tinha esse poema.
Artur Gomes – Revisitando Quintana: você acha que depois dessa crise virótica pandêmica, quem passará e quem passarinho?
Antonio Carlos Secchin – Espero que todos nós passemos, menos os abutres; esses, que tratem de se entredevorar.
Artur Gomes – Escrevendo sobre o livro Pátria A(r)mada, o poeta e jornalista Ademir Assunção, afirma que cada poeta tem a sua tribo, de onde ele traz as suas referências. Você de onde vem, qual é a sua tribo?
Antonio Carlos Secchin – Me alinho na tribo dos sem tribo. Convivo civilizadamente com várias delas, mas prezo demais a hipótese de poder acertar ou errar por conta própria, e não por ordem do cacique.
Artur Gomes – Nos dias atuais o que é ser um poeta, militante de poesia?
Antonio Carlos Secchin – Permito-me transcrever um poema que incluí em Desdizer, de 2017:
Auto retrato
Um poeta nunca sabe
onde sua voz termina,
se é dele de fato a voz
que no seu nome se assina.
Nem sabe se a vida alheia
é seu pasto de rapina,
ou se o outro é que lhe invade,
com voragem assassina.
Nenhum poeta conhece
esse motor que maquina
a explosão da coisa escrita
contra a crosta da rotina.
Entender inteiro o poeta
é bem malsinada sina:
quando o supomos em cena,
já vai sumindo na esquina,
entrando na contramão
do que o bom senso lhe ensina.
Por sob a zona da sombra,
navega em meio à neblina.
Sabe que nasce do escuro
a poesia que o ilumina.