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Antonio Carlos Secchin 

Um ourives, um lapidador de palavras, como aquele que tira leite das pedras. Comecei a ter contato com ele há alguns anos  por e-mail, e acompanhar suas atividades literárias a partir de postagens de amigos, poetas e produtores culturais, tais como Paulo Sabino e Igor Fagundes. que o levam a participar de palestras e leituras de poesia. Recentemente, entrevistei o poeta Diego Mendes Sousa, que organizou a Antologia Hálito das Pedras editado pela Penalux e nela está presente este magistral poema.

 

Biografia

 

O poema vai nascendo
num passo que desafia:
numa hora eu já o levo,
outra vez ele me guia.

O poema vai nascendo,
mas seu corpo é prematuro,
letra lenta que incendeia
com a carícia de um murro.

O poema vai nascendo
sem mão ou mãe que o sustente,e perverso me contradiz
insuportavelmente.

Jorro que engole e segura
o pedaço duro do grito,
o poema vai nascendo,
pombo de pluma e granito.

 

SECCHIN, Antonio Carlos. “Biografia”. In:___. Hálito das pedras. Antologia selecionada e organizada por Diego Mendes Sousa. Guartinguetá: Penalux, 2019.

 

foto 300x213 - arturgomes entrevista antonio carlos secchin

Antonio Carlos Secchin – nasceu no Rio de Janeiro, em 1952. É doutor em Letras e professor titular de Literatura Brasileira da Universidade Federal do Rio de Janeiro, além de professor visitante de várias universidades estrangeiras – na França, em Portugal, na Itália, na Venezuela, no México e nos Estados Unidos. Ensaísta, poeta e ficcionista, é autor de dez livros.

Alguns dos seus livros publicado são: João Cabral de Melo Neto: a poesia do menos (2ª edição, 1999, ganhador do concurso nacional de ensaios do INL/Ministério da Educação e Cultura em 1985 e do Prêmio Sílvio Romero da ABL em 1987), Todos os ventos (poesia reunida, 2002, prêmios da Fundação Biblioteca Nacional, da ABL e do PEN Clube), Escritos sobre poesia & alguma ficção (2003) e 50 poemas escolhidos pelo autor (2006). Responsável por várias seletas e obras completas de poetas brasileiros, tanto de nomes consagrados (Castro Alves, Cecília Meireles, Ferreira Gullar) quanto de autores à margem do cânone (Júlio Salusse). Hálito das Pedras – Antologia – Editora Penalux – 2019.  

 

 

É o sétimo ocupante da cadeira 19 da Academia Brasileira de Letras. Foi eleito em 3 de junho de 2004, na sucessão de Marcos Almir Madeira, e recebido em 6 de agosto de 2004 pelo acadêmico Ivan Junqueira. Em seu discurso de posse privilegiou os poetas ao destacar um belo trecho da obra de Cecília Meirelles: “Como os poetas que já cantaram,/ e que ninguém mais escuta,/ eu sou também a sombra vaga/ de alguma interminável música”. Depois, discorreu sobre os antigos ocupantes da cadeira 19, fazendo-lhes o “elogio”, tradicional trecho do discurso de posse dos acadêmicos, e, em seguida, rememorou a cidade de Cachoeiro de Itapemirim, onde viveu parte da infância:

 
Passando das areias monazíticas da praia às areias metafóricas da ampulheta do tempo, permito-me incluir, aqui, um pequeno excurso de natureza sentimental e biográfica. A vida me reservou a extraordinária felicidade de contar com a presença, na cerimônia de hoje, de meus pais, Sives e Regy, que se conheceram na década de 1940 no balneário de Guarapari, tão louvado por meu antecessor.
O primeiro mar que vi foi o da praia espírito-santense de Marataízes. Homenageio assim, por extensão, o estado do Espírito Santo, em que, por casualidade, não nasci, mas onde aprendi a ler e iniciei, fascinado, essa viagem sem volta na direção da escrita e da leitura.”

 

No encerramento do discurso de posse, Antonio Carlos Secchin mostrou, em sua refinada prosa-poética, a importância da Casa de Machado de Assis no panorama literário e cultural do país, finalizando com trecho de outro poeta magistral: Carlos Drummond de Andrade.

” Assim gostaria de entrar na Academia Brasileira de Letras: entendendo-a como fronteira franqueada ao livre trânsito de todas as temporalidades. De um lado, receptáculo de nossas mais fundas, atávicas, heranças; de outro, passagem para a paisagem do novo. Neste discurso, balizado por dois poetas, a primeira palavra, acolhendo o passado, foi de Cecília Meireles. Que a última seja de Carlos Drummond de Andrade:  

“Ó vida futura! nós te criaremos”.

Artur Gomes -Como se processa o seu estado de poesia?

 

Antonio Carlos Secchin – Como escreveu Manuel Bandeira, escrevo poesia quando ela quer. Persigo-a sempre, só a encontro (se é que a encontro) às vezes.

 

Artur Gomes – Seu poema preferido? Próprio. Ou de outro poeta de sua admiração.

 

Antonio Carlos Secchin – O meu-um que eu  diga: Me parece tão realizado que nem parece que fui eu que escrevi!
O de outro: quando, saindo do sonho de manhã, eu constate que o poema já existia, e era mesmo de outro autor.

 

Artur Gomes – Qual o seu poeta de cabeceira?

 

Antonio Carlos Secchin – Prefiro a cabeceira vazia, para que, antes de adormecer, a memória possa visitar vários poetas, trazendo-me um pouco de cada um. 

 

Artur Gomes – Em seu instante de criação existe alguma pedra de toque, algo que o impulsione para escrever?

 

Antonio Carlos Secchin – O desejo incontido do poema em ser escrito, ainda que eu não queira atendê-lo.

 

Artur Gomes -Livro que considera definitivo em sua obra?

 

Antonio Carlos Secchin – Tudo o que publico considero provisoriamente definitivo, correspondendo ao melhor de mim naquele momento. Numa segunda edição, tenho oportunidade de constatar quão provisório era meu “definitivo”, e tento torná-lo menos imperfeito.

 

Artur Gomes – Além da poesia em verso já exercitou ou exercita outra forma de linguagem com poesia?

 

Antonio Carlos Secchin – Para mim, dispor das palavras e conseguir dar-lhes certo ritmo já está de ótimo tamanho.

 

Artur Gomes – Qual poema escreveu quando teve uma pedra no meio do caminho?

 

Antonio Carlos Secchin – Iria escrever um que começasse por  “No  meio do caminho tinha uma pedra”, mas descobri que no meio do caminho já tinha esse poema.

 

Artur Gomes – Revisitando Quintana: você acha que depois dessa crise virótica pandêmica, quem passará e quem passarinho?

 

Antonio Carlos Secchin – Espero que todos nós passemos, menos os abutres; esses, que tratem de se entredevorar.

 

Artur Gomes – Escrevendo sobre o livro Pátria A(r)mada, o poeta e jornalista Ademir Assunção, afirma que cada poeta tem a sua tribo, de onde ele traz as suas referências. Você de onde vem, qual é a sua tribo?

 

Antonio Carlos Secchin – Me alinho na tribo dos sem tribo. Convivo civilizadamente com várias delas, mas prezo demais a hipótese de poder acertar ou errar por conta própria, e não por ordem do cacique.

 

Artur Gomes – Nos dias atuais o que é ser um poeta, militante de poesia?

 

Antonio Carlos Secchin – Permito-me transcrever um poema que incluí em Desdizer, de 2017:

 

Auto retrato

 

Um poeta nunca sabe

onde sua voz termina,

se é dele  de fato a voz

que no seu nome se assina.

 

Nem sabe se a vida alheia

é seu pasto de rapina,

ou se o outro é que lhe invade,

com voragem  assassina.

 

Nenhum poeta conhece

esse  motor  que maquina

a explosão da coisa escrita

contra a crosta da rotina.

 

Entender inteiro o poeta

é bem malsinada sina:

quando o  supomos em cena,

já vai sumindo na esquina,

entrando na contramão

do que o bom senso lhe ensina.

 

Por sob a zona da sombra,

navega em meio à neblina.

Sabe que nasce do escuro

a poesia  que o ilumina.

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